Filmes bacanas de cada ano que o cinema viveu: 1971

1- Morte em Veneza (Morte a Venezia, Luchino Visconti)Morte a VeneziaMeu primeiro Visconti ainda na tenríssima idade e seria quase nulo mencionar o tamanho da marca deixada em mim, numa época em que ainda há a sinceridade do gostar, sem afetação externa de fulaninhos dizendo ser Visconti um dos maiores do mundo. Mais do que Thomas Mann e semi-biografia de Gustav Mahler, Morte em Veneza soa como um testemunho autobiográfico do próprio Visconti, aquele Tadzio resplandece a mesma beleza e ar etéreo do jovem Helmut Berger quando Luchino o conheceu na pós-adolescência. Este filme é mesmo uma declaração de amor de Luchino à Helmut.

2- Os Demônios (The Devils, Ken Russell)The Devils (1971) - OLIVER REEDMelhor filme do Russell (dividindo as honras com The Debussy Film). Depois de Mulheres Apaixonadas, Russell se embrenhou na obra do companheiro de mescalina do DH Lawrence: Aldous Huxley (porque ingleses também fogem para o México, oras). Presumo que só faltou perspectiva temporal para que Russell se juntasse a eles no México, pois realmente se dava bem com Huxley e Lawrence, além de uma mente artística que muito lembrava uma mistura insana dos dois escritores, com a devida companhia de Derek Jarman como designer. Vanessa Redgrave freira-corcunda pensando em se masturbar com o osso (literalmente) do Oliver Reed é algo a não ignorar.

3- Quando Explode a Vingança (Giu La Testa, Sergio Leone)A Fistful of Dynamite - ROD STEIGERNão tente me falar de revolução. Sei tudo sobre revoluções e como elas começam! Gente que lê livros vai atrás de quem não lê, gente pobre, e diz: “Tem que haver mudanças. ” E a gente pobre faz as mudanças, hein? Ai, os que lêem livros se sentam em grandes mesas lustrosas e falam, falam, comem e comem, hein? Mas o que acontece com os pobres? Eles estão mortos! Essa é a sua revolução! Por isso, por favor… não me fale de revoluções. E o que acontece depois? A mesma podridão começa toda de novo! E os britânicos continuam a fugir para o México. Apesar de ser o mais subestimado dos filmes oficiais de Leone, ainda é um grande filme. Funciona como o exato objeto de transição dos seus cultuados spaghetttis para Era Uma Vez na América, as cenas envolvendo James Coburn no IRA são um exato prenuncio para o seu filme de gângsters americanos. Outro tema interessante é uma homenagem irônica à Sam Peckinpah e a utilização da câmera lenta, sendo usada para dilatação do tempo no amor e na amizade por parte de Leone ao contrário da habitual violência de Peckinpah.

4- Sweet Sweetback’s Baadasssss Song (Melvin Van Peebles)Melvin Van Peebles - Sweet Sweetback's BaadAsssss SongAo lado do Shaft de Gordon Parks Sr, este é o fundador oficial do gênero blaxploitation, mas ao contrário do seu colega que tinha aval dos grandes estúdios, Melvin van Peebles fez o seu filme na raça e deu ao público algo que eles certamente nunca tinham visto antes. 30 anos depois, seu filho Mario (que também está em Sweetback encarnando a personagem central quando jovem) mostrou a saga do pai para fazer esse classicaço no excelente filme How to Get the Man’s Foot Outta Your Ass, o qual também recomendo com louvor.

5- 200 Motels (Tony Palmer / Frank Zappa)Forte canditato a filme mais cool do rock and roll (desculpa aí, Lester & Russell!), não é lá muito bom, mas o que conta mesmo é o Keith Moon interpretando uma freira ninfomaníaca dando em cima do Ringo Starr vestido de Frank Zappa. Imaginou? Lindo.

6- Quatro Moscas no Veludo Cinza/O Gato de Nove Caudas (4 Mosche di Velluto Grigio/Il Gatto a Nove Code, Dario Argento)Four Flies on Grey Velvet (1971)Em 4 mosche di velluto grigio o Argento ainda soa mais como um grande devoto de Mario Bava, o que não é nenhuma tragédia, a cena final é tão boa que foi devidamente homenageada por Tarantino em Death Proof enquanto Il Gatto a Nove Code ajuda a fomentar o ano das duas melhores cenas finais da carreira de Argento. Ambos os filmes tocam num ponto giallico essencial: não adianta sair da cama, é no espaço aberto que está o horror.

7- Pistoleiro Sem Destino (The Hired Hand, Peter Fonda)The Hired Hand - WARREN OATES & PETER FONDAEsse é o tal filme que faz todos se perguntarem o porquê Peter Fonda não ter se jogado de vez na direção. Fonte assumida de inspiração para Clint e Os Imperdoáveis (mais até do que seus gurus Leone & Siegel), faz você pensar que Fonda e Oates deveriam ter feito duplinha por toda eternidade.

8- Um Lagarto com Pele de Mulher (Una Lucertola con la Pelle di Donna, Lucio Fulci)A Lizard in a Woman's Skin - FLORINDA BOLKAN & ANITA STRINDBERGFoi com este filme que me apaixonei por Anita Strindberg, a sequência inicial literalmente onírica onde ela aparece de botas 7/8 é algo que não pode nem deve ser ignorado. É aqui também que consta a famosa cena dos cachorros eviscerados que deu certa dor de cabeça ao Fulci, o carinha dos efeitos especiais, Carlo Rambaldi, foi tão foda que acabaram por chamá-lo para brincar de bonequinho com o Alien do Scott e o ET do Spielberg.

9- Pink Narcissus (James Bidgood)PINK NARCISSUS Bidgood é filho de Powell & pressburger e pai de muita gente, nem que seja adotivo, de Fassbinder a Lachapelle, de Pierre et Gilles a Todd Haynes, em algum momento de suas carreiras ele tomou esse povo pela mão e mostrou o caminho. Na época de seu lançamento ninguém sabia quem o havia dirigido, alguns creditaram o filme a Kenneth Anger, outros a Andy Warhol, em Anger eu posso ver o motivo da confusão de estilo com o de Bidgood, mas não em Warhol.

10- The Big Doll House (Jack Hill)Big Doll HouseUm dos melhores WIPs já feitos e provavelmente o melhor de todos comandado por um diretor americano. É uma vergonha Jack Hill não ser suficientemente valorizado.

11- Perseguidor Implacável (Dirty Harry, Don Siegel)Dirty Harry 1971E nasce um mito. Again.

12- The Tragedy of Macbeth (Roman Polanski)Macbeth - Jon Finch & Francesca AnnisPrimeiro filme do Polanski depois que um certo Charles Manson entrou em sua vida e o peso de tal experiência está espalhada por todo o filme, nenhum outro filme do diretor foi tão pesado, vilolento e tétrico quanto este, o que talvez não seja apenas fruto de experiências pessoais, mas de toda uma época, já que no mesmo mesmo podíamos ver Laranja Mecânica e Straw Dogs a verter violência por todos os lados. É um dos melhores trabalhos de Polanski, chegando a mesma excelência da versão de Kurosawa e ultrapassando a de Welles.

Real melhor filme do ano: Sob o Domínio do Medo (Straw Dogs, Sam Peckinpah)Straw Dogs - SUSAN GEORGEMenções mais do que honrosas a Laranja Mecânica (Kubrick), Two-Lane Blacktop (Hellman), Bang Bang (Tonacci), Minnie and Moskowitz (Cassavetes), Get Carter (Hodges) e A Batalha de Okinawa (Okamoto)

Nota: WTF? Link do pavor. Espero que isso não seja o que aparenta ser.

Publicado por Adriana Scarpin

Bibliófila, ailurófila, cinéfila e anarcafeminista. Really. Podem me encontrar também aqui: https://linktr.ee/adrianascarpin

5 comentários em “Filmes bacanas de cada ano que o cinema viveu: 1971

  1. Pô Dri, tu não sabes quão feliz eu fico em ler isso de ti. Saibas que teu blog já se transformou em ponto de referência magnânima na minha pretensão em saber um pouco mais de cinema.

    Teu conhecimento no assunto me espanta e me enriquece. Fico muito honrado em saber que meus poemas te acalantam.

    Besos.

    Vinícius Silva.

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  2. Morte em Veneza ainda é o único filme que vi do Visconti. Acho que eu gostei tanto que to escolhendo muito bem qual vai ser o próximo.

    The Devils ainda não vi, mas gostei do Debussy Film! Aquele final é sensacional, o judeu barbudo certamente viu muito Ken Russell pra aprender a musicar os próprios filmes.

    O filme do Zappa é tão lendário que eu preciso ver de qualquer jeito. E sou mega-fã dele, escuto qualquer gravação, por mais louca que seja.

    E preciso ver o Macbeth do Polanski, gosto bastante da versão do Welles.

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  3. Cara, aquele cara maluco por Wagner do Debussy Film me lembrou o Alex e sua loucura por Beethoven, aliás aquela sequência é total Laranja Mecânica. E particularmente gosto mais do cinema do Visconti dos anos 60/70 do que o anterior, mas sou bem suspeita porque é óbvio que prefiro esse período em geral do que o cinema dos anos 50.

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  4. conforme os anos retrocedem vou conhecendo menos coisas. vc deixou com água na boca de ver esse filme do frank zappa, que não sei como tem tudo a ver com mutantes e tropicália, ambos criaram coisas musicalmente muito parecidas (pra mim, na minha modesta opinião). vi get carter ontem. foda! aquelas atrizes inglesas…

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