Olhos Castanhos (Big Brown Eyes, 1936)

Que decepcionante. Só por ser um Raoul Walsh já seria digno de todo interesse, some a isso um elenco que inclua Joan Bennett e Lloyd Nolan – melhorou, não? Aí o que acontece? Resolvem escalar num mesmo filme dois atores que separados normalmente fariam palpitar os corações de todas as senhoiras presentes numa sala de cinema, mas que unidos provocariam o colapso do universo, um inevitável Big Crunch. Walter Pidgeon e Cary Grant, é claro. Brrrrrrrrrrrr Walter Pidgeon talvez seja o único ator do mundo que faça Cary Grant parecer um pedreiro em comparação, muito embora o pouco tempo em que dividam cena não deixa que isso fique evidentemente claro. Grant voltaria a dividir cena com ele em Dream Wife, mas com alguém desta estirpe apenas mais uma única vez em toda a sua carreira Grant se depararia, em Intriga Internacional, com a vantagem de James Mason nunca tê-lo feito parecer um membro educacionalmente menos favorecido da construção civil.
Lógico que não foram os moradores do Olimpo que me decepcionaram, para ser clara até agora não sei exatamente o que me decepcionou simplesmente porque não sei a que este filme veio, se me perguntassem a que gênero percente Big Brown Eyes nem sequer poderia cogitar em responder, não que ter um gênero redondido e facilmente identificável seja indispensável para qualquer filme, mas no caso deste em especial acho que foi mera falta de mão do quase sempre irretocável Raoul Walsh, este que parecia não saber se queria um screwball com toque policial ou um policial engraçadinho, o que acabou por desandar com qualquer que fosse sua intenção. Mesmo assim é curioso ver Grant praticamente dando a luz à sua persona screwball e ter a plena convicção de que Raoul Walsh foi o criador do Grant comediante de fala rápida com quem a gente só aprenderia a conviver a partir de Cupido é Moleque Teimoso e Levada da Breca.
Há pequenos momentos isolados que fazem valer a pena, como a cena em que Walsh muito sorrateiramente passa a perna na censura e rapidamente mostra Bennett e Grant dividindo a mesma cama, numa manobra de mestre. Essas pequenas grandes sacadas jorram aos borbotões durante o filme, como era habitual em todo o cinema de Walsh, mas o fato de não se decidir em ser um filme de gângster o suficiente e nem uma screwball o suficiente, faz que atmosfera geral do filme seja irregular e quase catastrófica em sua indecisão, afinal, nem todo mundo é Hitchcock.Nota 1: Passei boa parte da minha vida achando que Walter Pidgeon fosse britânico e só ano passado descobri que ele era canadense e não inglês, e pelo que pude notar é erro bastante comum, pois já o vi sendo chamado de Sir Walter Pidgeon e os canadenses não são aptos a ganharem título de cavaleiro.

Nota 2: Outra questão que sempre me atormentou foi o fato de Pidgeon nunca ter trabalhado com Hitchcock, quando era óbvio que ele era exatamente o tipo de ator que o velho Hitch apreciava – ao menos me atormentara até o mês passado quando assisti Amada por Três (The House Across the Bay, Archie Mayo, 1940) e pude conferir a única cena dirigida por Hitchcock naquele filme: Joan Bennett e Walter Pidgeon e os flertes passados num avião. É pouco, mas serve como sonho de consumo alcançado.

Nota 3: Azar da Joan Bennett, ao ter que dividir cena com aquelas pestilências todas. Eca.

Publicado por Adriana Scarpin

Bibliófila, ailurófila, cinéfila e anarcafeminista. Really. Podem me encontrar também aqui: https://linktr.ee/adrianascarpin

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